Happiness 2.0
Happiness 2.0
vomitado por Christian Palmer (sem meias palavras, sem meias vontades)
Acordei com a porra do despertador me chamando, como se fosse urgente viver.
Levantei, mijei, lavei o rosto e fiz café preto, amargo, igual a mim.
Vesti a primeira roupa que vi. Não sou ogro, juro — só cansei de me arrumar bonito pra dias feios.
No celular, o aviso.
Era folga. Aniversário.
Meu.
Ri.
Mas sem alegria.
Aquele riso de quem sacou a ironia da vida: te dão um dia livre no mesmo dia em que o peso te visita.
Voltei pra cama.
Dormi mal.
Sonhei pior.
Quando acordei de novo, o sol já era outro.
Mais café.
Um cigarro.
Fui à janela, como sempre — meu confessionário particular.
Quis pensar em algo, não veio nada.
Só o silêncio chupando meus pensamentos até deixá-los ocos.
O celular vibrou.
Happiness piscando.
Li a mensagem como quem relê bilhete antigo achado no bolso:
“Sei que é seu aniversário, não vou te dar parabéns. Comprei um vinho ontem. Pensei em dividir contigo. Saio às 17h30.”
Porra, quem ainda manda SMS em pleno 2025?
Conheci Happiness na faculdade.
Sentou do meu lado, com cheiro de chuva e cigarro de cravo.
Perguntou se eu curtia literatura ou só fingia pra comer gente.
Ri.
Respondi que dava no mesmo.
Riu junto.
Ficou salvo com esse nome porque disse que eu parecia estar procurando isso.
Falou rindo.
Mas salvei sério.
Essa filha da puta sempre aparece nos dias em que eu tô mais propenso a cair.
Bebi mais um gole.
Caguei.
Me olhei no espelho e não me reconheci - acho que é assim que o Tyler Durden se sente.
Preparei a casa do jeito que a gente monta palco pra show que talvez nem aconteça: limpei só o suficiente pra parecer que me importo.
Quando o interfone tocou, meu coração bateu no ritmo errado.
Porteiro: — Happiness tá aqui com uma garrafa de vinho, deixo subir?
Silêncio.
Me deu vontade de dizer sim.
De beber esse vinho.
De dar risada sem motivo.
De gozar com gosto.
De ouvir Florence e esquecer que amanhã tem trabalho, inferno.
Mas...
— Fala que não. Diz que hoje não. Que a felicidade chegou atrasada.
Desliguei.
Fiquei com raiva.
Sim. Deveria ter pedido pra que deixasse o vinho.
Fui burro!
Enfim, voltei pra janela.
Sobrou café na garrafa.
Peguei um caderno velho, escrevi.
Só assim eu não grito.
“Autoajuda é quando você mesmo manda a felicidade tomar no cu.”
Fim. Ou não.
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